quinta-feira, 10 de janeiro de 2008

Apologia ao Ócio-Criativo

Domenico De Masi, sociólogo italiano expôs suas idéias sobre a sociedade e o trabalho, sempre atento aos conceitos de uma visão de futuro.O autor é um insatisfeito com o modelo social centrado da idolatria do trabalho e propõe um novo paradigma baseado na simultaneidade entre trabalho, estudo, jogo e lazer, no qual os indivíduos são educados para privilegiar a satisfação de necessidades radicais, como a introspecção, a amizade, o amor, as atividades lúdicas, a ecologia, a paz, a convivência pacífica, o que, inteligentemente chama de ócio criativo.
Alerta ainda que o ócio pode transformar-se em violência, neurose vício e preguiça. Mas pode também elevar-se a arte, criatividade, liberdade e bem-estar. Lembra-nos que é no tempo livre que devemos passar a maior parte de nossos dias e neles concentrar nossas melhores potencialidades.
Narrando as mudanças de paradigmas ocorridas no decorrer da história da sociedade e do trabalho, conclui que chegamos a ponto de que o único emprego remunerado disponível é do intelectual criativo e aquele que não estiver preparado para isto, terá como futuro o desemprego. Tudo hoje é tecnologia.O futuro pertence aos que sabem usar mais a cabeça e menos as mãos. A pesquisa, a psicologia, o marketing, a arte, a educação, estas são as funções do futuro e não mais a guerra, o petróleo, a fabricação de parafusos e geladeiras.
É a subjetividade que orientará a vida e o trabalho daqui para frente. O homem sempre oscilou entre dois desejos: o de distinguir e o de homogeneizar num processo de dois séculos de homogeneização absolutamente imposto pela indústria. Hoje, a tecnologia nos permite diferenciar, e é o que estamos fazendo, criando ambientes inteligentes armazenados pelo computador; trabalhando em casa, estabelecendo relações virtuais com amigos e parentes; conjugando o pequeno, o grande, o individual e o coletivo.
A plenitude da atividade humana apenas é alcançada quando se acumulam o estudo, o trabalho e o jogo. Aquele que é mestre na arte de viver faz pouca distinção entre o seu trabalho e o seu tempo livre, entre a sua mente e o seu corpo, entre a sua educação e a sua recreação. Distingue uma coisa da outra com dificuldade.A intelectualidade prescinde à habilidade manual, devemos usar mais a cabeça do que a força física e entre as habilidades intelectuais a mais apreciada é a criatividade e o aspecto técnico prescinde do estético. É a estética que conduz à subjetividade. Outros valores emergentes são a emotividade e a feminilidade. Devemos valorizar sem temor a esfera afetiva. A racionalidade permite-nos executar bem as nossas tarefas, mas sem a emotividade não é possível criar nada de novo.
As pessoas devem aprender a curtir mais o tempo livre e usá-lo para si. Ficar no emprego mais tempo que o necessário só serve para inventar coisas prejudiciais e aumentar gastos e custos para as empresas que são habitudinárias como paquidermes e repetem a vida inteira as mesmas coisas sem que percebam a sua inutilidade.
Agora, com a Internet, tudo pode ser modificado com muito mais facilidade. Devemos evitar que o indivíduo, uma vez liberto, depois de décadas contínuas, não saiba lidar com esta nova situação, tendo dificuldades para enfrentar este impacto de liberdade. Uma pessoa que não tem tempo livre há anos precisará de uma reeducação para aprender a utilizá-lo, é lógico.
Hoje a forma mais adequada de se garantir a produtividade na empresa é, justamente, melhorar a qualidade de vida dentro e fora dela. É preciso deslocar o trabalho para onde estão os trabalhadores e sermos nômades em busca do lazer, do estudo e da cultura.
Aqueles que assimilam rapidamente as novas categorias se projetam para o futuro. O restante forma o grande exército de perdedores. No mundo de hoje, a velocidade impera, quem é lento fica à mercê. Quem é rápido, decide. O mundo exclui quem não é rápido. Privilegia-se a produção de idéias, exige-se corpo quieto e mente inquieta, o que eu chamo de "ócio criativo": ter mais tempo para "bolar", para "idear".
O ócio é uma arte e nem todos são artistas.
Contudo, teremos muitas resistências, sendo a maior delas, sem dúvida, o masoquismo coletivo: nem sempre as pessoas querem viver melhor e ser mais felizes.
Devemos, portanto, educar as pessoas também, eu diria, até principalmente, para o ócio e não só para o trabalho, como infelizmente acontece até os nossos dias.
Educá-las não para o ócio dissipador e alienante, que nos faz sentir vazios, inúteis e nos afundar no tédio, na depressão e nos subestimar. Mas no ócio criativo que torna a mente ativa, que nos faz sentir livres, fecundos e em crescimento. Não no ócio que nos depaupera, mas no que nos enriquece, alimentado por estímulos ideativos e interdisciplinaridades.
Chegou o tempo em que a vida aumenta e o trabalho diminui. Temos mais tempo, mais cultura e mais consciência disto. Diante desta revolução é esperada uma angústia existencialista .O tédio aumenta porque estamos acostumados a associar tudo na vida a uma só coisa: o trabalho que passou a ser, há milênios, o nosso compromisso-chave e este compromisso tem que passar a ser minoritário do ponto de vista temporal.
De que serve viver se você não se sente viver? Saber viver hoje implica uma pedagogia baseada na solidariedade, nos princípios estéticos e criativos e o trabalho deve ser ensinado como um prazer criativo e estimulante. Deve-se ensinar também o não-trabalho: a viver prazerosamente e com sabedoria, apenas se deliciando, nada ,mais.
Outra palavra de ordem é criatividade. Os jovens de hoje, em 2 015 não poderão dar-se ao luxo de serem desonestos, pois lá os valores emergentes serão escolarização, emotividade, estética, subjetividade, confiança, estabilidade, feminilização, qualidade de vida, desestruturação do tempo e do espaço e a virtualidade. Será dada menos atenção ao dinheiro, posses e bens materiais e ao poder. Maior atenção ao saber, ao convívio social, ao jogo, ao amor, à introspecção. Os métodos pedagógicos deverão valorizar mais o diálogo, a escuta, a solidariedade, a criatividade.

Viva o ócio-criativo!


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